NOSSO BLOG

A geração do sonho sertanejo

Há uma semana perdi uma grande amiga, e a gente começa a pensar nas pessoas que já nos deixaram. Meus avôs, minhas avós, tias, tios, irmão… meu pai. Meu pai como interiorano, fazia questão de semear nos filhos, o típico “sonho sertanejo”: verem os filhos formados na faculdade, virando “doutores”, sonhava em participar das formaturas e presentear o anel de formatura para eles. Mas, as filhas não faziam parte desse sonho.

E quando me formei, convidei-o para a formatura, mas ele não foi, me disse depois que não achava certo, porque não me ajudou a me formar, a pagar a formatura. Mas, pai! Claro que não. Como não ajudou?

Toda a determinação e persistência, cobrava tarefa, sentava do lado para dar apoio moral, tinha uma letra lindíssima, quase caligráfica, pegava na mão para ensinar o traçado, par que fizesse igual, fazia pensar no significado de cada palavra, fazia brincadeiras para distinguir o significado em contextos diferentes (manga da camisa e manga-fruta), sempre dizia: “Escrever não é para mim, é para os outros entender, o que escrevo, faz letra bonita”.

Nos ensinou a rimar palavras, incentivava a ler gibis, e quando não entendíamos a piada, ele explicava, e ríamos juntos. Ele tomava a leitura da Bíblia, de Genesis a Apocalipse. Nos Provérbios, sempre tinha que explicar, o que entendi, SE não entendia, ele explicava. Guardei comigo esse tempo valioso, e acabei, utilizando na minha prática como professora.

Tudo isso me veio à memória, porque estava lendo um artigo sobre as diversas gerações (X, Y, Z, ferro… e outras), e percebo que vivi em mundo paralelo, analógico, convivendo com a natureza, era Outro Mundo mesmo, o bairro Frigorífico Anglo. Tinha escola, farmácia, lojinha da Dona Tânia, açougue, parquinho, Clube do Frigorífico.

A saúde estava nas ervas do quintal, a medicina na benzedeira, o supermercado, na troca com os vizinhos, no bar do “Bibão”, os sonhos de consumo: geléia colorida, suspiro colorido com bolinhas prateadas, maria mole, bananinha, doce de abobora, e o sorvete, era conquistado, trocando os cascos da Don com o sorveteiro, com o risco de apanhar depois, mas carregando algumas sacolas, ganhava o troco que servia para comprar a Don do domingo com o casco, para não levantar suspeitas.

Tinha as lembranças não tão boas como beber Emulsão Scott, beber umas gotinhas de creolina no leite para os vermes, o chinelo de sola de pneu, e os bilhetes da professora, quando esquecia a tarefa, mas, o tempo passou, e as vivências ficaram e se tornaram boas histórias para embalar o sonho de muitas crianças e exemplificar ou até fazerem entender, o que é cuidado de pai, pois nem sempre sabem o que é isso…

“ Bebe água da tua cisterna, e das águas correntes do seu poço”, isso é Sankofa.

Compartilhe:

Coluna da Febatis

Sou a Ana Paula Ferreira ou “Febatis“, sou uma mulher preta e cristã, nascida em Barretos, cresci, casei com o Ismael e tenho dois meninos João Pedro, de 20 anos e Luiz Henrique com 16 anos. Bisneta da “Vó Vina” e seu Marcelino; neta de seu Xavier e Dona Luzia, avós maternos e D. Rosa e Seu Delcides, avós paternos, todos em memória e ancestralidade em mim. Minha mãe é Celia, que está em plena beleza e jovialidade no alto de seus 71anos. E meu pai, conhecido como “Zuis”, já dorme no Senhor.

Tenho sobrinhos, sobrinhas e sobrinhos-neto.
Aos 36 anos, entrei na Faculdade para trilhar o caminho do saber acadêmico, me formei em 2015 como Pedagoga e logo em seguida em 2020, me formei em História. E em 2022, terminei a pós graduação em Sociologia em Educação e Cultura.

O conhecimento é a ferramenta de mudança no mundo para transformar a vida e sonhos em realidade.

” O conhecimento é válido quando compartilhado “.

A Educação transformadora passa pela espiritualidade serena, acolhedora, amorosa e coletiva.

Outros textos de Febatis

Cultuando o Ori- Saberes e Conhecimentos Históricos sobre a religiosidade africana

Mulheres negras se movem como as águas, Nascemos alforriadas, Meus quadris carregam histórias, Meu andar manifesta histórias.Sou uma mulher liberta

Ninguém segura mulheres das águas

Mulheres negras se movem como as águas, Nascemos alforriadas, Meus quadris carregam histórias, Meu andar manifesta histórias.Sou uma mulher liberta

Mulheres negras, quais são seus caminhos?

As histórias africanas, o sagrado cultuado, os itans provam essa conexão com os elementos da natureza, pois somos parte dela: temos um corpo com 70% água, nos tornamos pó ao perder a essência vital, o corpo aquece e esfria como fogo para nos mostrar seu estado de saúde e o ar em nossos pulmões, determina a continuidade de nossa vida.

A geração do sonho sertanejo

Meus avôs, minhas avós, tias, tios, irmão… meu pai. Meu pai como interiorano, fazia questão de semear nos filhos, o típico “sonho sertanejo”: verem os filhos formados na faculdade, virando “doutores”, sonhava em participar das formaturas e presentear o anel de formatura para eles. Mas, as filhas não faziam parte desse sonho.

A terapia renova a vida… Inicios, meios e reinícios

Alinhamos o tempo em ciclos contínuos E desalinham repetições Porque todo momento é único, é parecido Mas, nunca é o mesmo Porque nada é novo, tudo é observação renovada

Velejo…

Não vou seguir o horizonte, vou buscar meu norte, Desviando da noite, do estopim, da morte,
Encontrei o meu espaço para aquilombar,
Entre minhas irmãs e irmãos, entre conversas guardiãs e sábias, esse é o meu lugar.