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Mulheres negras, quais são seus caminhos?

Quando nós falamos que “nossos passos vêm de longe”, falamos de um lugar muito antes da escravização. O nosso feminino sempre foi valorizado, nossos corpos, nossos cabelos e pele, sempre foram cuidados como templos. As crianças cuidadas por todos da comunidade, os homens cuidavam de suas famílias. Sempre tivemos consciência ambiental, criamos tecnologias de manejo de água, terra, construções para nós e cuidado com a natureza e nossos animais.

As histórias africanas, o sagrado cultuado, os itans provam essa conexão com os elementos da natureza, pois somos parte dela: temos um corpo com 70% água, nos tornamos pó ao perder a essência vital, o corpo aquece e esfria como fogo para nos mostrar seu estado de saúde e o ar em nossos pulmões, determina a continuidade de nossa vida.

E não precisa pensar muito para entender que o conceito de humanidade é ser  humano, natural em nós como pessoas. Mas, o que é antinatural é o valor que outros seres vivos colocam em sua vida. A opressão, julgamentos, estereótipos, violência, preconceitos e viés que foram (e são), expostos nossos corpos por serem pretos, e que terminaram (e ainda determinam) a continuidade existencial nesse mundo de tantas pessoas cotidianamente.

Reparação é uma dívida histórica que o Estado tem com um grupo de pessoas que foram deliberadamente, por força de decretos e leis, obrigados a viver em desvantagem, diante outros povos no mesmo território. Onde, estrategicamente foi deixada a margem dos direitos como humanos, não participaram do desenvolvimento econômico em equidade de direitos, invalidando sua existência e refutando tudo que remete aquele povo, população ou pessoas. Mas, como a nossa humanidade foi subestimada, rapidamente entendemos essa perspectiva imposta e qual a sua finalidade, e muitos de nossos ancestrais, sabiamente articularam, criaram estratégias, planejaram, contaram nossas histórias, se organizaram como povo e tivermos formação político social, e sem isso, não saberíamos de onde vieram nossos passos, como ressignificar nossa caminhada e preparar o futuro das próximas gerações para compreender sobre reparação histórica.

Por isso, a minha parte é “escurecer os fatos, contar nossas histórias, reconectar a ancestralidade, partilhar conhecimentos. Mas, se o Banco do Brasil, quiser me dar minha parte da reparação histórica em pix, também vou aceitar com bom grado, rs.

Mas, você entende o que é isso? Há um ditado africano que diz: “se não sabes de ondes vêm, e para onde vai, qualquer lugar serve”. E por isso, que nos foi tirado o direito de conhecer de onde viemos, nossas origens, nossos nomes africanos, propositalmente… para ficarmos perdidos. E para acharmos justa a reparação, temos que entender a garantia de direitos, devido aos fatos ocorridos em nossa história.

E quem precisa aprender para letrar racialmente, os seus, somos nós… e se quiser correr dessa conversa, é porque ainda precisa ampliar suas informações, conhecer e compreender, o que busca aqui.

Mas se compreendeu, você já entendeu o Movimento Aquilombar, Sankofa, de Mulheres Negras e está descolonizando seus pensamentos, reconhecendo-se em diáspora, como pessoa em luta como Ialodê*, ou Gueledê* ou como despertada de um sono… e está se preparando para a sua parte na missão.

Junte-se a nós nessa caminhada revolucionária, afetiva e poderosa. Nós só existimos na presença do outro… seja humano, seja natureza. Por isso, termino lhe dizendo: Sawabona (quer dizer, eu te respeito, eu te valorizo, você é importante para mim) e você responde: Shikoba (então, eu existo para você).

 

Ana Paula Febatis, pesquisadora, professora, historiadora, ativista social.

*Ialodê: rede de mulheres de negócios ou “mulheres de ganho” na diáspora.
* Gueledê: rede organizada encarregada de ensinar cultura, formação política, afetividade, arte, religiosidade e moda do feminino.

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Coluna da Febatis

Sou a Ana Paula Ferreira ou “Febatis“, sou uma mulher preta e cristã, nascida em Barretos, cresci, casei com o Ismael e tenho dois meninos João Pedro, de 20 anos e Luiz Henrique com 16 anos. Bisneta da “Vó Vina” e seu Marcelino; neta de seu Xavier e Dona Luzia, avós maternos e D. Rosa e Seu Delcides, avós paternos, todos em memória e ancestralidade em mim. Minha mãe é Celia, que está em plena beleza e jovialidade no alto de seus 71anos. E meu pai, conhecido como “Zuis”, já dorme no Senhor.

Tenho sobrinhos, sobrinhas e sobrinhos-neto.
Aos 36 anos, entrei na Faculdade para trilhar o caminho do saber acadêmico, me formei em 2015 como Pedagoga e logo em seguida em 2020, me formei em História. E em 2022, terminei a pós graduação em Sociologia em Educação e Cultura.

O conhecimento é a ferramenta de mudança no mundo para transformar a vida e sonhos em realidade.

” O conhecimento é válido quando compartilhado “.

A Educação transformadora passa pela espiritualidade serena, acolhedora, amorosa e coletiva.

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